sexta-feira, 20 de maio de 2022

Conan deixando a Marvel - Parte I - Analisando os últimos quatro anos

 


  Anos atrás, não me considerava um grande entusiasta de HQs. Lembro bem que foi em 2018, com o anúncio da republicação de "A Espada Selvagem de Conan" em formato capa dura, pela editora Panini Comics, que meu interesse na mídia em questão foi reaceso. 

    Eu não lia uma HQ já fazia mais de dez anos, mas desde 2018 até hoje, em meados de 2022, a situação mudou drasticamente. 
Minha coleção já passa dos quatrocentos itens, indo desde os saudosos formatinhos, até álbuns de luxo e omnibus(es) (esse diabo de palavra tem plural?).

    E foi durante essa mesma época que a Marvel Comics havia readquirido os direitos de publicação das HQs do personagem. Algo que (logicamente) foi motivo de muita conversa entre os fãs do cimério. 
Pois, foi na Marvel onde Conan foi apresentado para tantos leitores ao decorrer dos anos e imortalizado em séries de excelente qualidade. Mas ainda assim, dado o cenário atual do mundo, as HQs sofreram mudanças drásticas em suas narrativas, o que fez muitos fãs ficarem um tanto apreensivos com a volta do bárbaro para a casa das ideias. 

    Particularmente, como eu estava apenas retornando para o universo das HQs, decidi manter a cabeça aberta.
Em primeiro lugar, eu decidi conhecer melhor o trabalho do roteirista encarregado de trazer Conan de volta as páginas da Marvel.
Sr. Jason Aaron, que até então foi aclamado pelo seu run a frente do poderoso Thor. Uma fase que teve seus altos, bem altos, inclusive, e baixos de dar vergonha. 

Mas além do Sr. Aaron, a Marvel também anunciou um lançamento conjunto de um segundo título. Basicamente, um "revival" da magnífica "Espada Selvagem", e com uma proposta que julguei deveras interessante. Já que haveria uma rotação constante de roteiristas e artistas trabalhando no título. 

    Valendo o adendo de que tanto Conan como outros personagens oriundos da mente de Robert E. Howard também tiveram minisséries e aparições em outros títulos um tanto inusitados.

    Tudo isso parece muito legal até agora, mas o que importa de verdade aqui é que essa semana recebemos a notícia de que a Marvel Comics não seria mais detentora dos direitos do bárbaro favorito de todos, e que a Conan Properties International  (CPI daqui em diante) tem a intenção de começar sua própria linha de revistas baseada no universo de Howard.

    Meu intuito com esse artigo é, acima de tudo, fazer uma análise de (quase) tudo que foi publicado pela Marvel referente ao  mundo hiboriano,  nesses quatro anos em que a tanga peluda do cimério enfeitou suas páginas. 
Já ressalto que não li absolutamente tudo que foi lançado personagem durante esse período.  No entanto, pelo menos 80% do que foi publicado já foi devidamente consumido por este que vos escreve. 

    Nessa primeira parte de uma série de artigos que tenciono publicar nas próximas semanas, vamos analisar * SEM (MUITOS) SPOILERS * cada um dos títulos que contou com a ilustre presença de personagens criados por Howard, nesses quatro anos de Marvel Comics.
    Começando, obviamente, com o título principal, "Conan, O Bárbaro" por Jason Aaron e Mahmud Asrar
  
Conan, O Bárbaro - Jason Aaron & Mahmud Asrar (primeira fase)

    A reapresentação do cimério na Marvel foi feita com muitos floreios, já que logo na primeira edição da nova série temos uma página dupla que retrata os saudosos momentos do bárbaro na sua primeira passagem pela editora durante os anos 70.
    Algo que traz a nostalgia e a nos deixa no mindset correto para adentrar ao mundo hiboriano, cheio de brutalidade e de aventuras.
    A arte de Mahmud Asrar funciona muito bem para retratar a violência tão visceral das estórias de Conan, sem falar que a escolha do artista croata, Esad Ribic, como capista para a série não poderia ser mais acertada. Pois, ambas se complementam perfeitamente.

    Falando agora sobre a questão dos roteiros, é aí que a situação já não é tão harmoniosa quanto se espera. O Sr. Jason Aaron se tornou um dos grandes nomes entre os escritores modernos de HQs por bons motivos.  Ele tem uma cadência e peso em seus textos um tanto impares quando comparado aos seus contemporâneos. No entanto, ele tem um hábito que, por vezes, pode ser tido como inusitado por uns e irritante por outros. 
    Trata-se da insistência em quebrar paradigmas dentro do status quo dos personagens com quais ele trabalha, que muitos veem  até como um desrespeito aos mesmos. Por exemplo, tornar Thor, o mais poderoso e honroso dos vingadores, indigno de erguer seu martelo e ainda por cima passar o "título" de deus do trovão para outro personagem, no caso, sua ex-namorada, Jane Foster.
    Um rumo para a estória que foi recebida com divisão entre os fãs, mas, particularmente, a explicação do porque de Thor se tornar indigno e o transcorrer da fase que, obviamente, verá o deus do trovão retornar ao seu devido lugar, foi do meu agrado.
    Apesar do início magnânimo e do final fraquinho, foi uma boa fase, mas nem de longe chega sequer aos pés do seminal run de Walt Simonson no personagem. Comparação essa que é feita constantemente e, na real, apenas não...

    Mas focando em sua fase a frente do título de Conan, Sr. Aaron come bolas quase que imperdoáveis para os fãs antigos do personagem, e por tanto, todo aquele apelativo nostálgico da página dupla na abertura cai por terra.
    É claro que o Sr. Aaron tem um talento imenso para a escrita, mas não consigo deixar de pensar que muitas das decisões editoriais tomadas por ele foram feitas dentro de uma sala de reunião, como um bando de produtores e outros sujeitos da mesma laia que só "retocam" o texto, infelizmente, para muito, mas muito pior.

    Diferente do que foi feito com Thor, aqui não veremos mudanças tão drásticas (a primeira vista) para um novo leitor de Conan, mas para os fãs das antigas (que acredito ter sido o público alvo da nova revista), as inconsistências com as estórias originais são gritantes e, dessa vez sou obrigado a concordar, desrespeitosas não apenas com o personagem, mas com o próprio autor, Robert E. Howard.

    Não vou entrar no mérito das questões sociais e culturais do mundo moderno, mas aplicá-las num mundo fantástico já estabelecido a mais de 70 anos atrás é quase desonesto, a meu ver.
    Sei muito bem que hoje em dia tratar temas como "ódio racial", que era uma constante nas histórias de Conan, pois os cimérios e os pictos eram duas raças distintas que guerreavam por incontáveis gerações, pode ser um tanto arriscado. A temida cultura de cancelamento tá aí e ninguém quer ser pego por ela. Mas na real, por que RAIOS os pictos salvariam, se tornariam aliados e lutariam sob o comando de Conan da ciméria?
    Cacetada, não há outra motivação além da boa e velha "passada de pano" para tornar o personagem mais facilmente consumível para o público mais "frágil" de hoje.

    Sem contar ainda tantas outras pisadas na bola por parte do Sr. Aaron, pois está evidente que ele não é muito familiar com a obra de Howard. Já que seres míticos aparecem em abundância absurda e conceitos já estabelecidos são alterados a seu bel-prazer ou simplesmente ignorados, simples assim.

    Em uma média geral, não recomendo esse run para os fãs mais antigos de Conan. Apesar dos desenhos magníficos, e até mesmo da estória si também, que é ótima. Mas toda a fase é permeada de tropeços e decisões editoriais que, no mínimo, iram perturbar o leitor mais exigente.
    Caso você não conheça Conan e queira uma introdução ao personagem rápida e de fácil acesso, essa fase pode até ser tida como "adequada"(com aspas ENORMES). No entanto, ainda acredito que existam introduções melhores ao mundo hiboriano.

Conclusões:

    Prós :
    *Arte espetacular e estória cativante
    *Cada edição ainda conta com um conto curto no final de cada revista.
    *As cenas de ação e combate são plenas e em grandes proporções.
    *Uma tentativa de escrever uma estória nova para o personagem.

    Contras:
    *A falta de coesão com as histórias originais, beira o amadorismo.
    *Decisões editoriais que em nada contribuem para a estória ou para o personagem.
    *A falta de pesquisa por parte do roteirista é evidente.
   
NOTA FINAL: 3 / 5
    * Na real, ainda acredito que estou sendo generoso com essa nota, pois, fãs mais ávidos do que eu, nem sequer se deram ao trabalho de lê-la.
    Mas os ótimos desenhos e a trama que, apesar dos incontáveis problemas, ainda cativam e tem seu valor aqui e ali.


E é isso aí por ora, na semana que vem volto com mais alguns títulos e veremos se a coisa melhora.
Até lá!

sábado, 7 de maio de 2022

Três Viajantes, por Thiago Tizzot - Muitas promessas, poucos resultados

   Certa vez, me encontrei em um daqueles dias, em um fim de semana onde não havia absolutamente nada para se fazer, o tédio vai te consumindo lentamente e as decisões impulsivas e carentes de pensamento profundo te levam até lugares e situações inusitadas. Naquela ocasião, me peguei fazendo algo que (por razões sólidas) não tenho costume. Assistir vídeos de "booktubers" e buscar recomendações de livros de fantasia, em especial, de autores nacionais.

    Quem acompanha o blog ou me conhece pessoalmente, sabe muito bem que eu tenho gosto um tanto "nichado" e que mesmice pra mim não rola. Portanto, essa minha decisão de recorrer ao Youtube em busca de recomendações já pode ser vista como uma má ideia.

    Depois de passar por vários vídeos de canais diversos, lembro-me de ter chegado até um canal onde uma moça fez algumas sugestões de autores menos conhecidos que traziam em seus respectivos trabalhos os ares de aventura de uma boa partida de RPG.

    Um dos títulos que ela ressaltou foi "Três Viajantes" de Thiago Tizzot, um nome que deve soar familiar para alguns dos leitores. Pois, Sr. Tizzot foi responsável pela coletânea de contos "Crônicas de Espada e Magia", que compilou contos de nomes de peso como George R. R. Martin, Robert E. Howard e Michael Moorcock, até autores mais underground, mas de igual quilate como Karl Edward Wagner. Um trabalho digno de nota, com toda a certeza, mas, tratando-se de "Três Viajantes", a coisa já vai degringolando aos poucos.

    Livro adquirido, leitura iniciada em seguida, problemas começaram a surgir logo nas primeiras páginas. Essa é minha experiência com "Três Viajantes" resumida em apenas uma frase, mas vamos lá, melhor explicar onde quero chegar com mais detalhes.

    "Três Viajantes" é um livro um tanto curto, apenas 139 páginas, portanto, trata-se de uma leitura rápida, ainda mais pelo fato da diagramação do livro ser um tanto parca em cada página, já que há um recuo considerável nas bordas e a fonte utilizada é um pouco maior do que o habitual.

    A arte da capa também é bonita, e apesar de simples, e funciona bem na proposta. E apesar do ar meio "genérico", gosto dos pequenos detalhes presentes. Por exemplo, a arte completa só pode ser vista com o livro físico em mãos, pois ela se alastra para as dobras da capa, bem legal de se ver.

    Agora que já tirei os elogios da frente, vamos aos meus problemas com "Três Viajantes", e cacetada, são vários!
    Vamos por partes...

    Em primeiro lugar, "Três Viajantes" é um livro que não se decide sobre o que quer ser e que não cabe dentro de si mesmo. O que acontece aqui é um caso seríssimo de inchaço no texto, já que temos três protagonistas, um mundo gigantesco e com uma mitologia que expande séculos de história e vários coadjuvantes que não são nada além de "acessórios" para impulsionar os heróis na direção em que a história demanda. Valendo lembrar que não estamos falando de uma grande saga que se expande por vários tomos, mas sim num livro de bolso de 139 páginas.

    Outra coisa que me incomoda são os ditos "protagonistas", já que nenhum deles tem sequer uma mísera característica que seja marcante de forma positiva.
    Para que entendam melhor onde quero chegar, não consigo nem mesmo lembrar os nomes desses personagens, tudo que consegui reter deles foi "mago que fuma", "elfo" e o não menos importante "alquimista que faz par romântico com a coadjuvante do segundo ato", ou como eu preferi chamá-lo "o cara que não é o mago", já que eu passei vários momentos do texto confundindo os dois, já que eles eram tão indistintos um do outro que chegava a ser triste.

    O que nos leva ao terceiro problema gritante aqui, o texto por si só. Eu entendo, estamos falando de um lançamento praticamente independente, MAS CACILDA, cadê a revisão? Quase toda página conta com algum erro de digitação ou coisa similar, que poderiam ter sido facilmente corrigidos durante uma revisãozinha bem singela e simples. No entanto, esse ainda não é o meu maior problema com o texto, mas sim a repetição que permeia página, após página, após página, com informações maçantes e desnecessárias para a história.
    Para ilustrar melhor o que quero dizer, voltemos a um dos nossos carismáticos protagonistas, em específico, o mago fumante. Onde 99% das vezes em que ele aparece, temos de ler "e ele colocou o fumo em seu cachimbo" ou "ele fumava nervosamente seu cachimbo" ou ainda "ele fazia grandes nuvens de fumaça com o seu cachimbo". Não querendo fazer graça, mas esse tipo de artifício textual ficou tão repetitivo durante a leitura que tudo que me passava pela cabeça era "Vixi, esse vai ter câncer". E, sinceramente, que desagradável é ter que ler a cada página a mesmíssima coisa uma vez após a outra, só mudando algumas palavras aqui e ali.
    Esse tipo de artimanha não move a trama para frente, não engaja o leitor e não torna o personagem mais relacionável, apenas torna o texto chato de se ler.

    Vamos à história, onde, basicamente, temos esses três viajantes em busca de um fonte de sabedoria e poder incomparável, mas estão sendo constantemente perseguidos por um déspota que almeja o mesmo objetivo. Após sua fuga alucinada das masmorras do castelo do supracitado vilão, nosso grupo de heróis vai de encontro com uma elfa bibliotecária que lhes aponta a direção onde progredir. Basicamente, o livro se resumi a um constante "vá até lá e faço aquilo e venha até aqui e faça isso". E a conclusão não poderia ser mais anticlimática.

    O que me chateia aqui é o fato de que há sim um mundo interessante em "Três Viajantes", mas este não cabe dentro de 139 páginas!
    De novo, sou obrigado a me repetir, pois, esse é um livro curtinho em que a própria história e o mundo em que ele se situa, não cabem dentro dele!
    A proposta é boa, mas a execução peca em tantos níveis, que, infelizmente, meu interesse em checar mais trabalhos do autor é mínimo.

Comparar esse livro com uma partida de RPG tem sua valia, mas não da maneira que se imagina a priori. Pois, não estamos falando de uma partida épica e bem estruturada, mas sim de uma daquelas em que o mestre não se preparou em nada e está improvisando conforme as coisas vão acontecendo, tornando o jogo cada vez mais desinteressante.

Enfim, falando francamente, existem muitos outros autores nacionais que são dignos de sua atenção. Até creio que outros títulos do Sr. Tizzot podem ser melhores que o livro em questão, mas a verdade absoluta aqui é que "Três Viajantes" não é um bom livro.

    Mesmo assim, se caso ainda houver uma centelha que seja de interesse em você para conferir "Três Viajantes", minhas considerações finais são a seguintes:

    Por ser tão curto, o livro pode ser terminado em um ou dois dias e a despeito de sua tantas falhas, o livro ainda entretém, mesmo que bem pouco, dentro da sua proposta.
    Fica ao seu critério (e risco) encarar essa...

NOTA :  1,2